13 - Retorno, Reencarnação e Recorrência

“A vida de cada um de nós, com todos os seus tempos, é sempre a mesma, repetindo-se de existência em existência, através dos inumeráveis séculos”.

Samael Aun Weor 


A LEI DO ETERNO RETORNO


A Eternidade engole os que partem deste mundo; porém, com o tempo, os vomita. (Para que os quer por lá? Por acaso sabemos manejar as Forças Universais?). No devido tempo e hora, retornamos, regressamos, voltamos a este mundo. Não será muito agradável voltar, não é verdade? Mas voltamos.

Essa é a LEI DO ETERNO RETORNO DE TODAS AS COISAS. Regressam os planetas a seu ponto de partida, depois de alguns anos. Os átomos, dentro das moléculas, regressam a seu ponto original de partida. As estações, primavera, verão, outono e inverno, voltam a cada ano. Tudo retorna, tudo volta. Por que haveríamos de ser uma exceção?

El Quinto Evangelio “Realidad y Fantasía de Nuestra Psicología”

Na hora da morte, chega sempre diante do leito o Anjo da Morte. Destes há uma legião, e todos eles trabalham de acordo com a Grande Lei. Três coisas vão ao cemitério: primeiro, o cadáver físico.

Segundo, o Corpo Vital (este se escapa do corpo físico com a última exalação); este veículo flutua diante do sepulcro e vai se decompondo lentamente à medida que o corpo físico se desintegra.

Terceiro, a ex-personalidade. Esta, indiscutivelmente, pode às vezes escapar da tumba e perambular pelo cemitério, ou dirigir-se a alguns lugares que lhe são familiares. Não há dúvida de que a ex-personalidade se dissolve lentamente através do tempo; não existe nenhum amanhã para a personalidade do morto; esta em si mesma é perecedora.

Aquilo que continua, aquilo que não vai ao sepulcro, é o Ego, o Mim Mesmo, o Si Mesmo. A morte é uma subtração de frações; terminada a operação matemática, só restam os valores. Obviamente, as somas de valores se atraem e se repelem de acordo com a Lei da Imantação Universal; flutuam na atmosfera do mundo. 

A Eternidade abre sua garganta para engolir o Ego e logo o expele, o afasta, o devolve ao tempo. Foi-nos dito que, no instante preciso da morte, no momento em que o defunto exala seu último alento, projeta um “desenho” eletro psíquico de sua personalidade; tal desenho continua nas Regiões Suprassensíveis da natureza e mais tarde vem a saturar o óvulo fecundado; assim é como, ao retornar, ao regressar, ao reincorporar-se em um novo corpo físico, voltamos a possuir características pessoais muito similares às da vida anterior.

Isso que continua depois da morte não é, pois, algo muito bonito. Aquilo que não é destruído com o corpo físico não passa de um amontoado de diabos, de Agregados Psíquicos, de defeitos. A única coisa decente que existe no fundo de todas essas entidades cavernosas que constituem o Ego é a Essência, a Psique, isso que temos de Alma.

Ao regressar a um novo veículo físico, entra em ação a Lei do Karma, pois não existe efeito sem causa, nem causa sem efeito. Os Anjos da Vida se encarregam de conectar o cordão de prata com o zoosperma fecundante; inquestionavelmente, muitos milhões de zoospermas escapam no instante da cópula, mas só um deles tem poder suficiente para penetrar no óvulo a fim de realizar a concepção.

Esta força de tipo muito especial não é um produto do acaso; o que ocorre é que está impulsionado a partir de sua energia íntima pelo Anjo da Vida que, em tais instantes, realiza a conexão da Essência que retorna.

Os biólogos sabem muito bem que os gametas masculino e feminino tem, cada um, 24 cromossomos; somados entre si dão o total de 48, que vêm a compor a célula germinal. Estes 48 cromossomos nos recordam as 48 leis que governam o corpo físico.

A essência é conectada, portanto, com a célula germinal por meio do cordão de prata e, como tal célula se divide em duas, as duas em quatro, as quatro em oito e assim sucessivamente para o processo de gestação fetal, é claro que a energia sexual se converte de fato no agente básico de tal multiplicação celular; isto significa que o fenômeno da mitose não poderia realizar-se de modo algum sem a presença da energia criadora.

O desencarnado, aquele que se prepara para tomar um novo corpo físico, não penetra no feto; só vem a reincorporar-se no instante em que a criatura nasce, no momento preciso em que realiza sua primeira inalação.

É muito interessante o fato de que com a última exalação do moribundo vem a desencarnação, e que, com a primeira inalação, reingressamos em um novo organismo. É completamente absurdo afirmar que alguém escolhe de forma voluntária o lugar onde deve renascer.

A realidade é muito diferente. São precisamente os Senhores da Lei, os Agentes do Karma, que escolhem para nós o lugar exato, lar, família, país, etc., onde devemos nos reincorporar, retornar.

Se o Ego pudesse escolher o local, lugar ou família, etc., para sua nova reincorporação, então os ambiciosos, orgulhosos, avarentos e cobiçosos buscariam os palácios, as casas dos milionários, as ricas mansões, os leitos de rosas e de plumas e o mundo seria todo cheio de riqueza e suntuosidade; não haveria pobres, não existiria a dor nem a amargura, ninguém pagaria Karma, todos poderíamos cometer os piores delitos sem que a Justiça Celestial nos alcançasse, etc., etc., etc.

A crua realidade dos fatos é que o Ego não tem direito a escolher o lugar ou a família onde deve nascer; cada um de nós tem que pagar o que deve; está escrito que aquele que semeia raios colherá tempestades; Lei é Lei, e a Lei se cumpre.

É, portanto, lamentável que tantos escritores famosos da espiritualidade contemporânea afirmem de forma enfática que cada um tem o direito de escolher o lugar onde deve renascer. O que há além do sepulcro é algo que somente os homens despertos podem conhecer: aqueles que já dissolveram o Ego, os que são verdadeiramente Autoconscientes.

No mundo existem muitas teorias, de tipo espiritualista ou materialista, e a razão dos humanoides intelectuais dá para tudo; a razão pode criar tanto teorias espiritualistas quanto materialistas.

Os homúnculos racionais podem elaborar em seu encéfalo cerebral, mediante os processos lógicos mais severos, tanto uma teoria materialista como uma espiritualista, e, tanto em uma quanto na outra, tanto na tese quanto na antítese, a lógica de fundo é realmente admirável. Inquestionavelmente, a razão, como faculdade de investigação, com todos os seus processos lógicos, tem um princípio e um fim; é demasiado estreita e limitada, pois, como já dissemos, presta-se a tudo, serve para tudo: tanto para a tese quanto para a antítese.

Evidentemente, os processos de cerebrização lógica não são por si mesmos convincentes, pelo fato concreto de que com eles pode-se elaborar qualquer tese espiritualista ou materialista, demonstrando ambas o mesmo vigor lógico, certamente plausível para todo humanoide raciocinante.

Não é possível que a razão conheça verdadeiramente nada do que há “da telha para cima”, do que está mais além, disso que continua depois da morte. Immanuel Kant, o grande filósofo alemão, já demonstrou, em sua obra intitulada “A Crítica da Razão Pura”, que a razão por si mesma não pode conhecer nada sobre a verdade, sobre o real, sobre Deus, etc., etc., etc.

Não estamos, pois, lançando ao ar ideias a priori; o que estou dizendo com ênfase pode ser documentado com a citada obra do filósofo mencionado. Obviamente, temos que descartar a razão como elemento de cognição idônea para o descobrimento do real.

Arquivados os processos racionais nesta questão de metafísica prática, estabeleceremos a partir de agora mesmo uma base sólida para a verificação disso que está mais além do tempo, daquilo que continua e que não pode ser destruído com a morte do corpo físico. Estou afirmando algo que me consta, algo que experimentei na ausência da razão.

Não é demais lembrar ao honrado leitor que eu recordo todas as minhas vidas anteriores. Nos antigos tempos, antes da submersão do continente Atlante, as pessoas tinham desenvolvida essa faculdade do Ser conhecida com o nome de “Percepção Instintiva das Verdades Cósmicas”. Depois da submersão deste antigo continente, essa preciosa faculdade entrou no ciclo involutivo descendente e se perdeu totalmente.

É possível se regenerar essa faculdade mediante a dissolução do Ego. Conseguindo tal propósito, poderemos verificar por nós mesmos, de forma autoconsciente, a Lei do Eterno Retorno de todas as coisas. Indubitavelmente, a citada faculdade do Ser nos permite experimentar o Real, isso que continua, isso que está além da morte, do corpo físico, etc., etc., etc.

Como possuo tal faculdade desenvolvida, posso afirmar com plena autoridade o que me consta, o que vivi, o que está além, etc., etc. Falando sinceramente e com o coração na mão, posso dizer-lhes o seguinte: os defuntos vivem normalmente no Limbo, na antessala do Inferno, na Região dos Mortos, Astral Inferior, região plenamente representada em todas essas grutas e cavernas subterrâneas do mundo, que, unidas ou entrelaçadas intimamente, formam um todo em seu conjunto.

É lamentável o estado em que se encontram os defuntos: parecem sonâmbulos, têm a Consciência completamente adormecida, perambulam por todas as partes e creem firmemente que estão vivos; ignoram sua morte. Depois da desencarnação, os comerciantes continuam em seus comércios, os bêbados nas cantinas, as prostitutas nos prostíbulos, etc., etc.

Seria impossível que pessoas assim, sonâmbulos desse tipo, inconscientes, pudessem dar-se ao luxo de escolher o lugar onde devem renascer. O mais natural é que nasçam sem saber a que hora, nem como, e morram completamente inconscientes.

As sombras dos falecidos são muitas; cada desencarnado é um montão de sombras inconscientes, um montão de larvas que vivem no passado, que não se dão conta do presente, que estão engarrafadas em todos os seus dogmas, nas coisas rançosas do passado, nas ocorrências dos tempos idos, nos sentimentos, nas paixões animais, nos vícios, etc., etc., etc.

Ao renascer, a Essência se expressa durante os primeiros três ou quatro anos da infância, e então a criatura é bela, sublime, inocente, feliz. Infelizmente, o Ego começa a expressar-se pouco a pouco ao nos aproximarmos dos 7 anos de idade, e vem a se manifestar totalmente quando a nova personalidade foi totalmente criada.

É indispensável compreender que a nova personalidade se cria precisamente durante os primeiros 7 anos da infância e que se robustece com o tempo e com as experiências. A personalidade é energética, não é física, como pretendem muitas pessoas, e depois da morte se decompõe lentamente no cemitério até se desintegrar radicalmente.

Antes de que a nova personalidade se forme totalmente, a Essência pode dar-se ao luxo de manifestar-se com toda sua beleza, e até faz com que as crianças pequenas sejam certamente psíquicas, sensitivas, clarividentes puras, etc., etc.

Quão felizes seríamos se não tivéssemos Ego, se somente se expressasse em nós a Essência; indiscutivelmente, então não haveria dor, a Terra seria um paraíso, um Éden, algo inefável, sublime.

O retorno do Ego a este mundo é verdadeiramente asqueroso, horripilante, abominável. O Ego irradia ondas vibratórias sinistras, tenebrosas, nada agradáveis. Eu digo que toda pessoa, enquanto não haja destruído o Ego, é mais ou menos negra, ainda que se presuma de santa e virtuosa.

O incessante retorno de todas as coisas é uma Lei da Vida, e podemos verificá-lo de instante em instante e de momento em momento.

A Terra retorna ao seu ponto de partida a cada ano, e então celebramos o ano novo; retornam todos os astros ao seu ponto de partida original, retornam os átomos dentro da molécula a seu ponto inicial; retornam os dias; retornam as noites; retornam as quatro estações: primavera, verão, outono e inverno; retornam os ciclos, kalpas, yugas, Mahanvantaras, etc.

A Lei do Eterno Retorno é, pois, algo indiscutível, irrefutável, irrebatível.


A REENCARNAÇÃO


Reencarnação implica uma individualidade reencarnante, e, se tal individualidade não existe, então não há tal reencarnação. Ainda que os textos pseudo-ocultistas afirmem que o animal intelectual já alcançou a individualidade, este conceito é tão falso como aquele outro que assegura que o ser humano possui os autênticos veículos solares: Astral, Mental e Causal.

O Ego é um conjunto de entidades diferentes, diversas, que nem sequer se conhecem entre si; isso não é individualidade. Dizer que essas entidades se reencarnam é absurdo. Melhor é dizer que o eu pluralizado regressa, reincorpora-se, retorna a esse vale de lágrimas.

Mensagem de Natal 1967-1968

O Baghavad-Gita, o livro sagrado do Senhor Krishna, diz textualmente o seguinte: “O Ser não nasce, nem morre, nem se reencarna: não tem origem, é eterno, imutável, o primeiro de todos, e não morre quando lhe matam o corpo”.

Que nossos leitores gnósticos reflitam agora no seguinte versículo antitético e contraditório. “Assim como alguém deixa suas vestes gastas e põe outras novas, assim o Ser corpóreo deixa seu corpo gasto e entra em outros novos”. Dois versículos opostos do grande Avatar Krishna.

Se não conhecêssemos a chave, é óbvio que ficaríamos confundidos: “Ao deixar o corpo, tomando o sendeiro do fogo, da luz, do dia, da quinzena luminosa da Lua e do solstício setentrional, os conhecedores de Brahma vão a Brahma”.

“O iogue que ao morrer vá pelo sendeiro da fumaça, da quinzena obscura da Lua e do solstício meridional, chega à esfera lunar (o mundo astral) e logo renasce (retorna, reincorpora-se)”. “Estes dois sendeiros, o luminoso e o obscuro, são considerados permanentes. Pelo primeiro o iogue se emancipa e pelo segundo renasce (retorna)”.

Declaremos que o Ser, o Senhor encarnado em alguma criatura perfeita, pode voltar, pode reencarnar-se...

“Quando o Senhor (o Ser) toma um corpo, ou o deixa, ele se associa com os seis sentidos ou os abandona e se vai como a brisa que leva consigo o perfume das flores”. “Dirigindo os ouvidos, os olhos, os órgãos do tato, gosto e olfato e também a mente, Ele experimenta os objetos dos sentidos”.

“Os ignorantes, alucinados, não o veem quando Ele toma um corpo, o deixa ou faz as experiências associando-se com as Gunas; em troca, os que têm os Olhos da Sabedoria o veem”. Como documento extraordinário para a doutrina da Reencarnação, vale a pena meditar no seguinte versículo do Senhor Krishna: “Oh Bharata!, toda vez que declina a religião e prevalece a irreligião, encarno-me de novo (quer dizer, me reencarno) para proteger os bons, destruir os maus e estabelecer a religião, encarno-me (ou reencarno) em distintas épocas”.

De todos estes versículos do Senhor Krishna, deduz-se logicamente duas conclusões:

  • Os conhecedores de Brahma vão a Brahma e podem, se assim o querem, voltar, incorporar-se, reencarnar-se para trabalhar na Grande Obra do Pai.
  • Aqueles que não dissolveram o Ego, o Eu, o Mim Mesmo, vão depois da morte pelo sendeiro da Fumaça, da quinzena obscura da Lua e do solstício meridional; chegam à esfera lunar e em seguida renascem, retornam, reincorporam-se neste doloroso Vale do Samsara.

A doutrina do Grande Avatar Krishna ensina que somente os Deuses, Semideuses, Reis Divinos, Titãs e Devas se reencarnam. Retorno é algo muito diferente: é inquestionavelmente o Retorno de Kalpas, Yugas, Mahamvantaras, Maha-Pralayas, etc., etc., etc.

A palavra reencarnação é muito exigente; não se deve usá-la de qualquer maneira: ninguém poderia reencarnar-se sem haver antes eliminado o Ego, sem ter de verdade uma Individualidade Sagrada.

Reencarnação é uma palavra muito venerável; significa de fato a reincorporação do Divino em um homem. Reencarnação é a repetição de tal acontecimento cósmico; uma nova manifestação do Divino...

De nenhuma maneira exageramos conceitos ao enfatizar a ideia transcendental de que a Reencarnação só é possível para os Embriões Áureos que já obtiveram, em qualquer ciclo de manifestação, a união gloriosa com a Super Alma.

Seria absurdo confundir a Reencarnação com o Retorno. Seria cair em um desatino da pior espécie afirmar que o Ego (legião de Eus tenebrosos, sinistros e esquerdos) possa se reencarnar.


A LEI DA RECORRÊNCIA


É interessante observar as palavras de Eudemo, discípulo de Aristóteles (no terceiro livro de Física). Ele disse: “Algumas pessoas aceitam e algumas outras negam que o tempo se repete. A repetição pode ser entendida de diversas maneiras.

Um tipo de repetição acontece na ordem natural das coisas, como a repetição dos verões, dos invernos e das outras estações, em que uma nova vem depois que outra desapareceu; a esta ordem de coisas pertencem os movimentos dos corpos celestes e os fenômenos produzidos por eles, tais como os solstícios e os equinócios.

Porém, se devemos crer nos Pitagóricos, existe outro tipo de repetição. Isso quer dizer que eu vos falarei e me sentarei exatamente assim, e terei em minha mão o mesmo bastão, e tudo será igual a agora, e o tempo, como é de se supor, será o mesmo.

Porque, se os movimentos (dos corpos celestes) e muitas outras coisas são os mesmos, o que ocorreu antes e o que ocorrerá depois é também o mesmo. Isto se aplica também à repetição, que é sempre a mesma. Tudo o mesmo.”

Mensagem de Natal 1967-1968

Um homem é o que é sua vida; se um homem não trabalha sua própria vida, está perdendo o tempo miseravelmente. Só eliminando os elementos indesejáveis que levamos em nosso interior podemos fazer de nossa vida uma obra prima.

A morte é o regresso ao princípio da vida, com a possibilidade de repeti-la novamente no cenário de uma nova existência. As diversas escolas de tipo pseudo-esoterista e Pseudo-Ocultista sustentam a teoria eterna das vidas sucessivas.

Tal conceito está equivocado. A vida é um filme; concluída a projeção, enrolamos a fita em seu carretel e a levamos para a eternidade. O reingresso existe, o retorno existe; ao voltar a este mundo projetamos sobre o tapete da existência o mesmo filme, a mesma vida.

Podemos colocar a tese de existências sucessivas, mas não de vidas sucessivas, porque o filme é o mesmo. O ser humano tem uns três por cento de essência livre e uns noventa e sete por cento de essência engarrafada dentro dos eus.

Ao retornar, os três por cento de essência livre impregnam totalmente o óvulo fecundado; inquestionavelmente continuamos na semente de nossos descendentes. Personalidade é diferente; não existe nenhum amanhã para a personalidade do morto; esta vai se dissolvendo lentamente no cemitério.

No recém-nascido só se acha reincorporada a pequena porcentagem de essência livre; isto dá à criatura autoconsciência e beleza interior.

Os diversos eus que retornam dão voltas ao redor do recém-nascido, vão e vêm livremente por toda parte; gostariam de meter-se dentro da máquina orgânica, mas isto não é possível enquanto não seja criada uma nova personalidade.

Convém saber que a personalidade é energética, e que se forma com a experiência através do tempo. Está escrito que a personalidade se cria durante os primeiros sete anos da infância, e que posteriormente se robustece e se fortifica com todas as experiências da vida prática.

Os eus começam a intervir dentro da máquina orgânica pouco a pouco, à medida que a nova personalidade vai sendo criada. A morte é uma subtração de frações; terminada a operação matemática, a única coisa que continua são os valores (isto é, os eus bons e maus, úteis e inúteis, positivos e negativos).

Os valores se atraem e se repelem entre si na luz astral, de acordo com as leis da imantação universal. Somos pontos matemáticos no espaço e servimos de veículo a determinadas somas de valores.

Dentro da personalidade humana de cada um de nós existem sempre estes valores que servem de embasamento à Lei de Recorrência. Tudo volta a acontecer tal como sucedeu, mais o resultado ou consequência de nossas ações precedentes.

Como dentro de cada um de nós existem muitos eus de vidas precedentes, podemos afirmar de forma enfática que cada um deles é uma pessoa diferente. Isto nos convida a compreender que dentro de cada um de nós vivem muitíssimas pessoas com diferentes compromissos.

Dentro da personalidade de um ladrão existe um verdadeiro covil de ladrões; dentro da personalidade de um homicida existe todo um clube de assassinos; dentro da personalidade de um luxurioso existe uma casa de encontros; dentro da personalidade de qualquer prostituta existe todo um prostíbulo, etc.

Cada uma destas pessoas que levamos dentro de nossa personalidade tem seus problemas e seus compromissos. Gente vivendo dentro de nós, pessoas vivendo dentro das pessoas; isto é irrefutável, irrebatível.

O grave de tudo isto é que cada uma destas pessoas ou eus que vive dentro de nós vem de antigas existências e tem determinados compromissos. O eu que na passada existência teve uma aventura amorosa na idade de trinta anos, na nova existência aguardará a mesma idade para manifestar-se, e, chegado o momento, procurará a pessoa de seus sonhos, colocar-se-á em contato telepático com ela e, ao fim, virá o reencontro e a repetição da cena.

O eu que na idade de quarenta anos teve uma disputa por bens materiais, na nova existência aguardará tal idade para repetir a mesma disputa. O eu que na idade de vinte e cinco anos brigou com outro homem na cantina ou no bar, aguardará na nova existência a idade de vinte e cinco anos para buscar seu adversário e repetir a tragédia.

Os eus de um e de outro sujeito se procuram mutuamente mediante as ondas telepáticas, e logo se reencontram para repetir mecanicamente a mesma coisa. Esta é realmente a mecânica da Lei de Recorrência; esta é a tragédia da vida.

Através de milhares de anos os diversos personagens se reencontram para reviver os mesmos dramas, comédias e tragédias. A pessoa humana não é mais que uma máquina ao serviço destes eus com tantos compromissos.

O pior de toda esta questão é que todos estes compromissos das pessoas que levamos em nosso interior se cumprem sem que nosso entendimento tenha alguma informação prévia. Neste sentido, nossa personalidade humana parece um carro arrastado por múltiplos cavalos.

Há vidas de exatíssima repetição, existências recorrentes que nunca se modificam. De modo algum poderiam se repetir as comédias, dramas e tragédias da vida sobre a tela da existência se não existissem os atores.

Os atores de todas estas cenas são os eus que carregamos em nosso interior e que vêm de antigas existências. Se desintegramos os eus da ira, as cenas trágicas da violência terminam inevitavelmente.

Se reduzimos a poeira cósmica os agentes secretos da cobiça, os problemas da mesma terminam totalmente. Se aniquilamos os eus da luxúria, as cenas de prostíbulo e de morbidez acabam. Se reduzimos a cinzas os personagens secretos da inveja, os eventos relacionados com a mesma terminarão radicalmente.

Se matamos os eus do orgulho, da vaidade, da presunção, da auto importância, as cenas ridículas derivadas destes defeitos terminarão por falta de atores. Se eliminamos de nossa psique os fatores da preguiça, da inércia e da frouxidão, as horripilantes cenas deste tipo de defeitos não poderão repetir-se por falta de atores.

Se pulverizamos os eus asquerosos da gula, acabarão os banquetes, as bebedeiras, etc., por falta de atores. Como estes múltiplos eus se manifestam lamentavelmente nos diversos níveis do Ser, faz-se necessário conhecer suas causas, sua origem e os procedimentos crísticos que finalmente haverão de conduzir-nos à morte do “mim mesmo” e à liberação final.


UMA VIVÊNCIA PESSOAL


Quero esclarecer agora, com uma série de relatos insólitos, o que é a Lei da Recorrência. Certamente a citada lei nunca foi para mim algo novo, estranho ou extravagante: em nome disso que é o Divino, devo afirmar de forma especial que essa pragmática regra só a conheci através de minhas inusitadas vivências.

Dar fé de tudo aquilo que realmente experimentamos diretamente é um dever para com nossos semelhantes. Jamais quis escapar, evadir-me intelectualmente dessa múltipla variedade de recordações relacionadas com minhas três existências anteriores e o que corresponde a minha vida atual.

Para o bem da Grande Causa pela qual estamos lutando intensamente, prefiro encarar, assumir responsabilidades, pagar, confessar francamente meus erros, diante do veredito solene da consciência pública.

É oportuno declarar agora, de forma veraz e sem rodeios, que eu fui, na Espanha, o Marquês Juan Conrado, terceiro Grande Senhor da Província de Granada.

É evidente que essa foi a época dourada do famoso Império da Espanha: o cruel conquistador Hernán Cortés, aleivoso como ninguém, havia atravessado com sua espada o coração do México enquanto o impiedoso Pizarro, no Peru, fazia fugir as cem mil virgens.

Como muitos nobres e plebeus, aventureiros e perversos em busca de fortuna, embarcavam constantemente para a Nova Espanha, eu de modo algum poderia ser uma exceção. Em uma simples caravela, frágil e ligeira, naveguei durante vários meses pelo borrascoso oceano com o propósito de chegar a estas terras da América.

Não é exagero afirmar que jamais tive a intenção de saquear os Templos Sagrados dos Augustos Mistérios, nem de conquistar povos ou destruir cidadelas. Andei certamente por estas terras da América em busca de fortuna; infelizmente, cometi alguns erros.

É necessário estudá-los para conhecer os paralelos e verificar conscientemente a sábia Lei de Recorrência. Estes eram meus tempos de Boddhisattwa caído, e por certo não era uma mansa ovelha.

Passaram-se os séculos, e, como tenho a consciência desperta, jamais pude esquecer tanto desatino. O primeiro paralelo que devemos estudar se corresponde exatamente com meu atual corpo físico.

Tendo chegado numa frágil embarcação da mãe-pátria, estabeleci-me muito próximo dos penhascos nestas costas do Atlântico. Naqueles tempos da conquista espanhola, existia desgraçadamente este outro negócio internacional relacionado com a infame venda de negros africanos.

Então, para o bem ou para o mal, conheci uma nobre família de cor, originária da Argélia. Ainda recordo uma donzela tão negra e tão formosa como um sonho milagroso das Mil e Uma Noites.

Se compartilhei com ela o leito de prazeres no Jardim das Delícias, fui realmente movido pelo incentivo da curiosidade; queria conhecer o resultado deste cruzamento racial. Que dele nasceu um filho mulato, nada tem de estranho; mais tarde vieram o neto, o bisneto e o tataraneto.

Naqueles tempos de Boddhisattwa caído, esqueci-me das famosas marcas astrais que se originam no coito e que todo desencarnado leva em seu “Karmasaya”. É claro e manifesto que tais marcas o relacionam com as pessoas e o sangue associados com o “coito químico”; é oportuno dizer agora que os iogues da Índia já fizeram sobre isto profundos estudos.

Não é demais afirmar que meu atual corpo físico descende da citada cópula metafísica; em outras palavras, direi que assim vim a estar vestido com a carne que tenho em minha existência presente.

Meus antepassados paternos foram exatamente os descendentes daquele ato sexual do Marquês. É assombroso saber que nossos descendentes se convertem em ascendentes através do tempo e da distância. É maravilhoso que, depois de alguns séculos, venhamos a revestir-nos com nossa própria carne, convertendo-nos em filhos de nossos próprios filhos.

A vida do Marquês foi caracterizada por viagens incessantes por estas terras da Nova Espanha, e isto se repetiu em minhas existências subsequentes, incluindo a atual. Litelantes, como sempre, esteve a meu lado, suportando pacientemente todas essas sandices de meus tempos de Boddhisattwa caído.

Chegando o outono da vida em cada reencarnação, confesso sem rodeios que sempre tive de partir com a “enterradora”, uma antiga Iniciada pela qual sempre abandonava minha esposa e que em uma e outra existência cumpriu com seu dever de me dar sepultura cristã.

No entardecer de minha vida presente, voltou a mim essa antiga Iniciada; reconheci-a de imediato, porém, como já não estou caído, repudiei-a com doçura; ela se afastou angustiada.

Revestido com essa personalidade altiva e até insolente do Marquês, iniciei o retorno à pátria depois de certa rixa asquerosa motivada por um carregamento de diamantes em bruto extraídos de uma mina muito rica.

Para o bem de muitos leitores não é exagero fazer certa ênfase, afirmando cruamente que, depois de um curto intervalo na região dos mortos, entrei novamente em cena, reencarnando na Inglaterra. Ingressei na ilustre família Bleler, e fui batizado com o piedoso nome de Simeon.

Na flor da juventude transladei-me à Espanha, movido pelo anseio íntimo de retornar à América. Assim trabalha a Lei de Recorrência. Obviamente se repetiram no espaço e no tempo as mesmas cenas, idênticos dramas, despedidas semelhantes, etc., incluindo, como é natural, a viagem pelo oceano tempestuoso.

Saltei à terra, intrépido, nas costas tropicais da América do Sul, habitadas então por diversas tribos. Explorando várias regiões selvagens habitadas por animais ferozes, cheguei ao vale profundo de Nova Granada, aos pés das montanhas de Monserrate e Guadalupe: belo país governado pelo Vice-Rei Solís. É inquestionável que, por esses tempos, começava de fato a pagar o Karma que devia desde os anos do Marquês.

Entre estes crioulos da Nova Espanha, resultavam inúteis meus esforços para conseguir algum trabalho bem remunerado; desesperado pela má situação econômica, ingressei como um simples soldado raso no exército do Soberano: pelo menos ali encontrei pão, roupa e refúgio.

Aconteceu que, num dia festivo, bem de manhã, as tropas de Sua Majestade se preparavam para render honras muito especiais a seu chefe, e por isso se distribuíam aqui e acolá realizando manobras com o propósito de organizar filas.

Ainda recordo certo sargento mal-encarado e brigão que, revisando seu batalhão, dava gritos, maldizia, batia, etc. Prontamente, chegando diante de mim, me insultou gravemente porque meus pés não estavam em correta posição militar, e depois, observando detalhes minuciosos de minha jaqueta, me esbofeteou iradamente.

O que aconteceu a seguir não é muito difícil de adivinhar: não se pode esperar jamais nada de bom de um Boddhisattwa caído. Sem reflexão alguma, torpemente, cravei minha sanguinária baioneta de aço em seu peito de guerreiro.

O homem caiu por terra ferido de morte; gritos de pavor eram escutados por todos os lugares. Mas eu fui astuto, e, aproveitando precisamente a confusão, a desordem e o espanto, escapei daquele lugar, perseguido muito de perto pelos soldados bem armados.

Andei por muitos caminhos rumo às costas escarpadas do Oceano Atlântico; procuravam-me por todos os lugares, e por isso evitava sempre a passagem pelas alfândegas, dando muitas voltas através da selva.

Nos caminhos trafegáveis (que eram bem poucos naqueles tempos), passavam ao meu lado algumas carruagens puxadas por pares de briosos cavalos: nesses veículos viajavam pessoas que não tinham meu Karma, pessoas endinheiradas.

Um dia qualquer, à beira do caminho, próximo a uma aldeia, achei um comércio humilde, e entrei com o desejo de beber alguma coisa; queria me animar um pouco. Fiquei atônito, confuso e assombrado ao descobrir que a dona desse negócio era Litelantes. Oh! eu a havia amado tanto e agora a encontrava casada e mãe de muitos filhos. Que reclamação poderia fazer? Paguei a conta e saí dali com o coração dilacerado...

Continuava a marcha pelo caminho, quando com certo temor pude verificar que alguém vinha atrás de mim: o filho da senhora, uma espécie de prefeito rural. Aquele jovem tomou a palavra para dizer-me: “De acordo com o artigo 16 do Código do Vice-Rei, você está detido”.

Tentei inutilmente suborná-lo: aquele cavaleiro bem armado me conduziu diante dos tribunais, e é óbvio que, depois de ser sentenciado, tive de pagar uma longa pena de prisão pela morte do sargento.

Quando saí em liberdade, caminhei pelas margens selvagens e terríveis do caudaloso rio Magdalena, exercendo trabalhos materiais muito duros onde tivesse a oportunidade. Como nota interessante do presente capítulo, devo dizer que a Essência desse prefeito pelo qual tive de passar tantas amarguras, encerrado em uma imunda masmorra, retornou com corpo feminino; é agora uma de minhas filhas; já é até mãe de família, tendo me dado alguns netos.

Antes de seu reingresso, interroguei essa Alma nos mundos suprassensíveis; perguntei-lhe sobre o motivo que a induzia a querer-me como pai; respondeu dizendo que tinha arrependimento pelo mal que me havia causado, e que queria portar-se bem comigo para corrigir seus erros.

Confesso que está cumprindo sua palavra. Naquela época, me estabeleci nas costas do Oceano Atlântico depois de infinitas amarguras cármicas, repetindo assim todos os passos do insolente Marquês Juan Conrado...

O melhor que fiz foi haver estudado o esoterismo, a medicina natural, a botânica... Os nobres aborígenes daquelas terras tropicais me deram seu amor, agradecidos pelo meu trabalho de médico: curava-os sempre de forma desinteressada...

Algo insólito aconteceu certo dia: a espetacular aparição de um grande senhor vindo da Espanha. Esse cavalheiro me contou seus infortúnios. Trazia em seu navio toda sua fortuna, e os piratas o perseguiam. Queria um lugar seguro para suas riquezas.

Fraternalmente lhe ofereci consolo, e até lhe propus abrir um buraco e guardar nele suas riquezas: o senhor aceitou meus conselhos, não sem antes exigir-me solene juramento de honra e lealdade.

Com a fragrância da sinceridade e o perfume da cortesia, entramos em entendimento. Depois, dei ordens a minha gente, um grupo muito seleto de aborígenes. Estes cavaram a terra. Feito o buraco, colocamos ali com grande diligência um baú grande e uma caixa menor, contendo barras de ouro maciço e ricas joias de incalculável valor.

Por meio de certos exorcismos mágicos, fiz o encantamento da “preciosa guardada”, como dissera Don Mario Roso de Luna [N.T.: esoterista espanhol], com o propósito de tornar o tesouro invisível aos desagradáveis olhos da cobiça.

O cavalheiro me remunerou muito bem, fazendo-me generosa entrega de uma bolsa com moedas de ouro, e depois se afastou desses lugares, com o propósito de voltar a sua pátria para trazer dali sua família, pois desejava estabelecer-se senhorialmente nestas belas terras da Nova Espanha.

O relógio de areia do destino jamais se aquieta; passaram os dias, os meses e os anos, e aquele bom homem jamais regressou; talvez tenha morrido em sua terra, ou caído vítima da pirataria que então infestava os sete mares; não sei.

Existem casos sensacionais na vida; certo dia em minha presente reencarnação, estando longe desta minha terra mexicana, falava sobre este assunto com certo grupo de irmãos gnósticos, dentre os quais sobressaía por sua sabedoria o Mestre Gargha Kuichines.

Tive então uma tremenda surpresa: vi com místico assombro como o Soberano Comendador G.K. se levantava para confirmar de forma enfática minhas palavras. O citado Mestre nos informou que ele pessoalmente havia visto tal relato escrito em belos versos.

Nos falou de um velho livro empoeirado, e lamentou havê-lo emprestado. Valham-me Deus e Santa Maria! pois eu nada sabia de tal tratado. Velhas tradições antiquíssimas nos dizem que muitas pessoas dessas costas do Caribe estiveram procurando o tesouro de Bleler.

O curioso é que aqueles nobres aborígenes, que antes haviam enterrado tão rica fortuna, estejam novamente reincorporados, formando o grupo do Summum Supremum Santuarium. Assim trabalha a Lei de Recorrência.

Recordo claramente que, depois daquela minha tempestuosa existência com a dita personalidade inglesa, fui constantemente invocado por essas pessoas que se dedicam ao espiritismo.

Queriam que lhes dissesse o lugar onde se encontrava guardado o delicioso ouro, cobiçavam o tesouro de Bleler; porém, é evidente que, fiel a meu juramento na região dos mortos, jamais quis entregar-lhes o segredo. Repetindo os passos do insolente Marquês Juan Conrado, em minha subsequente existência vim a reencarnar-me no México; fui batizado com o nome de

Daniel Coronado; nasci no norte, nos arredores de Hermosillo, lugares todos estes conhecidos em outros tempos pelo Marquês. Meus pais quiseram para mim o melhor, e ainda jovem me inscreveram na Academia Militar, mas tudo foi em vão.

Num desses dias, aproveitei muito mal um fim de semana em banquetes e bebedeiras com más companhias. Confesso ainda, com certa vergonha, que tive de voltar para casa com o uniforme de cadete sujo, esfarrapado e envilecido...

É óbvio que meus pais se sentiram defraudados. É evidente que não voltei jamais à Academia Militar: Indubitavelmente, desde esse momento começou meu caminho de amarguras... Felizmente reencontrei então Litelantes; ela se encontrava reencarnada com o nome de Ligia Paca (ou Francisca). Em boa hora me recebeu como esposo...

Biografar qualquer vida é de fato um trabalho muito difícil, e de substancioso conteúdo, e por isso só faço ressaltar, com fins esotéricos, determinados detalhes.

Inquestionavelmente, eu não desfrutava de situação folgada; ganhava com dificuldade o pão nosso de cada dia; muitas vezes comia com o mísero salário de Ligia; ela era uma pobre professora de escola rural, e, para cúmulo, até a atormentava com meus execráveis ciúmes.

Não queria ver com bons olhos todos esses colegas do magistério que lhe tinham amizade... Entretanto, fiz algo útil naqueles tempos: formei um belo grupo esotérico gnóstico em plena Cidade do México.

Os estudantes dessa congregação retornaram a mim em minha atual existência, de acordo com a Lei da Recorrência... Durante o cruento regime porfirista tive um cargo por certo não muito agradável na Polícia Rural.

Cometi o erro imperdoável de julgar o famoso “Golondrino”, perigoso bandoleiro que assolava a comarca; é claro que tal malfeitor morreu fuzilado... Em minha atual existência o reencontrei reincorporado em corpo humano feminino; sofria delírio de perseguição, temia que o prendessem por furto; lutava para desatar-se de certos laços imaginários; acreditava que iriam fuzilá-lo...

É claro que cancelei minha dívida curando essa doente; os psiquiatras haviam falhado lamentavelmente: não foram capazes de curá-la... Ao explodir a rebelião contra Don Porfirio Díaz [N.T.: presidente do México], abandonei o nefasto posto na Rural. Então, com humildes proletários, pobres peões surrupiados das fazendas dos senhores, organizei um batalhão.

Era certamente admirável este valoroso punhado de gente humilde armada apenas com facões, pois ninguém tinha dinheiro para comprar armas de fogo. Felizmente o General Francisco Villa nos recebeu na Divisão do Norte; ali nos deram cavalos e fuzis.

Não há dúvida de que, nesses anos de tirania, lutamos por uma grande causa; o povo mexicano gemia sob as botas da ditadura... Em nome da verdade, devo dizer que minha personalidade como Daniel Coronado foi certamente um fracasso: as únicas coisas pelas quais valeu a pena viver foram o grupo esotérico no Distrito Federal e meu sacrifício na revolução...

Aos meus companheiros da rebelião digo: abandonei as fileiras quando adoeci gravemente. Nos últimos dias dessa vida tormentosa, andei pelas ruas da Cidade do México, descalço, com as roupas feitas em pedaços, faminto, velho, doente e mendigando...

Confesso francamente, com profundo pesar, que vim a morrer em um casebre imundo. Ainda recordo aquele instante em que o médico, sentado em uma cadeira, depois de me haver examinado, exclamou, balançando a cabeça: “Este caso está perdido”, e em seguida se retirou.

O que vem a seguir é tremendo: sinto um frio espantoso como gelo de morte. Aos meus ouvidos chegam gritos de desespero: “São Pedro, São Paulo, ajudem-no!” - assim exclamava essa mulher à qual chamo “a enterradora”. Estranhas mãos esqueléticas me agarram pela cintura e me tiram do corpo físico.

É óbvio que o Anjo da morte interveio. Resolutamente corta com sua foice o cordão de prata, a seguir me bendiz e se afasta. Bendita morte, quanto tempo fazia que te aguardava, ao fim viestes em meu auxílio, minha existência era bastante amarga! Repousei feliz nos mundos superiores depois de inumeráveis amarguras: certamente a humana dor dos mortais tem também seu limite, além do qual reina a paz.

Infelizmente, não durou muito aquele repouso no seio profundo da Eternidade: um dia qualquer, muito tranquilo, veio a mim um dos brilhantes Senhores da Lei. Tomou a palavra e disse: “Mestre Samael Aun Weor, já está tudo pronto, siga-me”. Eu respondi de imediato: “Sim, Venerável Mestre, está bem, segui-lo-ei”. Andamos então juntos por diversos lugares, e finalmente entramos numa casa senhorial; atravessamos um pátio, passamos por uma sala e a seguir entramos no quarto da dona da casa: ouvimos que se queixava, sofria dores de parto...

Esse foi o instante místico em que vi com assombro o cordão de prata de minha existência atual conectado psiquicamente à criança que estava por nascer. Momentos depois aquela criatura inalava com avidez o prana da vida: senti-me atraído para o interior desse pequeno organismo, e então chorei com todas as forças de minha alma...

Vi ao meu redor algumas pessoas que sorriam, e confesso que me chamou especialmente a atenção um gigante que me olhava com carinho; era meu pai terreno. Não faz mal dizer com certa ênfase que aquele bom autor de meus dias foi, na época medieval, durante os tempos da cavalaria, um nobre senhor que tive de vencer em cruentas batalhas.

Jurou então vingança, e é claro que a cumpriu em minha existência presente. Abandonei muito jovem a casa de meus pais, movido por dolorosas circunstâncias, e viajei por todos aqueles lugares onde antes estivera em vidas passadas.

Repetiram-se os mesmos dramas, as mesmas cenas: Litelantes apareceu novamente em meu caminho, reencontrei-me com meus velhos amigos; quis falar-lhes, porém não me reconheceram; foram inúteis meus esforços para fazê-los recordar nossos tempos antigos.

Entretanto, algo novo sucedeu em minha presente reencarnação: meu Real Ser interior fez esforços desesperados, terríveis, para trazer-me ao caminho reto, do qual havia me desviado há muito tempo. Confesso francamente que dissolvi o Ego e que me levantei do lodo da terra.

É óbvio que o Eu está submetido à Lei da Recorrência; quando o “Mim Mesmo” se dissolve, adquirimos liberdade, tornamo-nos independentes da citada lei. A prática me ensinou que as diferentes cenas das diversas existências se processam dentro da espiral cósmica, repetindo-se sempre, seja em espirais mais altas ou mais baixas.

Todos os feitos do Marquês, incluindo suas inúmeras viagens, repetiram-se sempre em espirais cada vez mais baixas nas três reencarnações subsequentes. Existem no mundo pessoas de repetição automática, exata, pessoas que renascem sempre na mesma cidade e em sua própria família.

É evidente que tais Egos já sabem de memória seu papel, e até se dão ao luxo de profetizar sobre si mesmos: é claro que a constante repetição não os deixa esquecer acontecimentos, por isso parecem adivinhos. Tais pessoas costumam assombrar seus familiares pela exatidão de seus prognósticos.